No término do ano passado, as expectativas para a economia em 2016 não eram nada animadoras, com o mercado esperando uma queda de 2,0% do PIB. Passados oito meses, os agentes de mercado pioraram bastante suas percepções e atualmente mencionam uma retração de 3,2%, resultado pouco melhor do que o apresentado efetivamente no ano passado.

Para o mercado de crédito, já era dado como certa a existência de um crescimento negativo do saldo de empréstimos em termos reais, com variação negativa de aproximadamente 1%. No entanto, a piora da atividade econômica aliada à drástica deterioração do mercado de trabalho fizeram com que o ritmo das concessões de crédito diminuísse de forma muito mais intensa que o inicialmente esperado, o que por sua vez obrigou a uma revisão de todas as projeções de mercado para o setor.

Com expectativa de queda real de cerca de 8%, caso confirmado, o estoque de crédito registrará novo recorde negativo consecutivo, diminuindo na comparação com o ano anterior a relação crédito-PIB, fato inusitado no histórico disponibilizado pela série do Banco Central (BC).

No entanto, das notícias negativas, ao menos se extrai uma boa mudança de perspectiva para a inadimplência. Ao olharmos a série oficial do BC destinada aos recursos livres, 2015 encerrou o ano com um nível de 6,2% do total de recursos concedidos ao sistema financeiro. Ao somarmos a perspectiva negativa do mercado de trabalho, a expectativa era de que em 2016 observássemos uma elevação dos atrasos dos pagamentos, fato que não se concretizou, e que, aliás, manteve-se praticamente estável até a metade do ano, com redução de apenas 0,1 p.p. em sua taxa, um resultado que deverá se manter até o fim do ano.

Observando algumas variáveis antecedentes, no final do ano passado os Registros de Inadimplência contabilizados na base do SCPC subiram apenas 2,4%, enquanto a Recuperação de Crédito (fluxo de saída da base do SCPC) caiu em igual magnitude (-2,4%).

Ocorre que, atualmente, o fluxo de entrada na base do SCPC manteve-se próximo ao mesmo nível registrado em dezembro, com aumento de 3,3% observado na última aferição deste ano (referente a julho), enquanto que a saída da base de inadimplentes subiu para níveis neutros ao longo do primeiro semestre, variando -0,2% no último mês. Ou seja, em termos de estoque de inadimplentes tais movimentos contribuem para uma melhoria de seu atual nível.

Ademais, a própria redução das concessões agiu na forma de comedir o aumento da inadimplência. Este fenômeno tem basicamente duas explicações.

A primeira deriva do fato macroeconômico: com juros e incertezas de um modo geral elevados, o próprio consumidor tem demandado menos crédito voltado ao consumo, ao passo que as instituições financeiras reagem de forma a calibrar seus novos empréstimos, ofertando menos recursos.

A segunda explicação deriva do efeito estatístico do cômputo da inadimplência: com as concessões cedendo de forma expressiva, o saldo total acaba diminuindo a um ritmo menos intenso, já que em um passado recente o volume de crédito aumentou consideravelmente e seus prazos também se estenderam. Tal fator diminui a inadimplência total, uma vez que a taxa é estabelecida pela divisão do montante inadimplente sobre o estoque total concedido.

Além disso, para as empresas, as perspectivas também se tornaram mais positivas. Após recordes consecutivos do aumento da inadimplência dos recursos livres, na aferição de junho do BC a inadimplência aparenta ter estagnado seu crescimento, atingindo 5,1%. Com elevação quase que exponencial desde meados de 2014, o inadimplemento não deu folga, fator que levou as instituições financeiras a fecharem a “torneira” do crédito mais cedo para os empresários do que a das linhas voltadas para as famílias.

Agora, a tendência de atrasos dos pagamentos das empresas deverá ser mantida estável até o final do ano, uma vez que o fluxo de inadimplência calculado pela Boa Vista SCPC também caminha para uma estagnação de seus indicadores. O indicador, que é um somatório dos principais mecanismos de apontamento de inadimplência empresarial (isto é, cheques devolvidos, títulos protestados e registros realizados na base da Boa Vista SCPC), mostrou desaceleração do crescimento no segundo trimestre do ano nos valores acumulados nos quatro últimos trimestres, com crescimento de 7,8%, número 1,8 p.p. menor que o registrado no primeiro trimestre do ano.

A notícia vem em boa hora, pois deverá colaborar para uma melhoria das condições de crédito num próximo passo e interromper o elevado ritmo de falências, além de se alinhar com outras variáveis macroeconômicas, que mostram uma melhora dos indicadores de atividade, juros e também do mercado de trabalho, conjuntura que indica que o pior da crise econômica já foi superado.

Ainda assim, vale a menção, estamos longe de avistarmos um céu de brigadeiro. A recuperação de diversos setores produtivos ainda caminha de forma muito lenta e essa demora no tempo de resposta dos agentes econômicos adiciona ruído ao cenário de crédito através de uma manutenção de spreads em níveis elevados. Estes, por consequência, acabam atuando negativamente tanto na questão da concessão, já que os juros finais se tornam mais altos e inibem potenciais tomadores de crédito, além de penalizar de forma mais contundente aqueles já realizaram os empréstimos e que se encontram na situação de inadimplência.

Por fim, o vetor resultante de todo esse cenário pode ainda ser considerado como positivo nas atuais circunstâncias. Após 2 anos extremamente negativos da economia, pode-se dizer que o mercado de crédito foi um dos que menos sofreu e agora aparenta apenas aguardar uma oportunidade para retomada de seu crescimento.

(*) Artigo originalmente publicado pelo site do IBEF (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo) em 23 de julho de 2016.