Por Flávio Calife e Yan Cattani

Após um biênio extremamente difícil para a economia brasileira, finalmente começa-se a vislumbrar um cenário positivo para os agentes econômicos em 2017.

Fazendo um breve retrospecto sobre 2016, para o mercado de crédito este ano já era considerada a possibilidade de um crescimento negativo do saldo de empréstimos em termos reais, com variação negativa de aproximadamente 1%.

No entanto, a piora da atividade econômica aliada à drástica deterioração do mercado de trabalho fizeram com que o ritmo das concessões de crédito diminuísse de forma muito mais intensa que o inicialmente esperado, o que por sua vez obrigou a uma revisão de todas projeções de mercado para o setor.

Com expectativa de queda real de cerca de 8%, caso confirmada, o estoque de crédito registrará novo recorde negativo consecutivo, diminuindo na comparação com o ano anterior a relação crédito-PIB. Fato inusitado no histórico disponibilizado pela série do Banco Central (BC).

Além dos fatores macroeconômicos, que dificultaram o ambiente de negócios e diminuíram drasticamente os indicadores de confiança da economia, a política monetária exercida pelo Banco Central (BC) contribuiu adicionalmente para piora do quadro de oferta de crédito.

Em menos de dois anos, a taxa básica de juros praticamente dobrou seu nível, elevando consequentemente a taxa final de juros para os agentes econômicos. Tal fato acabou atuando negativamente tanto na questão da concessão – já que os juros finais se tornam mais altos e inibem potenciais tomadores de crédito, além de penalizar de forma mais contundente aqueles já realizaram os empréstimos e que se encontram na situação de inadimplência – assim como na questão de demanda por crédito.

Sobre este último comportamento, por parte do consumidor há evidências reiteradas sobre a aversão de tomada de empréstimos. O Indicador de Demanda por Crédito dos Consumidores da Boa Vista SCPC encontra-se desde dezembro de 2013 em níveis negativos.

Outros dados, referentes à Pesquisa de Endividamento e Inadimplência da FecomercioSP (PEIC) mostraram tanto um menor número de consumidores dispostos a tomar empréstimos inferior à média histórica, assim como a diminuição da proporção de famílias endividadas.

Para o cenário de inadimplência, contudo, a majoração dos juros foi contrabalanceada justamente pela menor demanda por crédito.

O fluxo de entrada de inadimplência na base do SCPC (Indicador de Registros de Inadimplentes) manteve-se próximo ao mesmo nível registrado em dezembro de 2015, com aumento de 2,2% observado na última aferição deste ano (referente a agosto no acumulado de 12 meses). Enquanto que a saída da base de inadimplentes (Indicador de Recuperação de Crédito) subiu para níveis neutros ao longo do primeiro semestre. Ou seja, em termos de estoque de inadimplentes tais movimentos contribuem para uma melhoria de seu atual nível.

Com relação à inadimplência apontada pelas empresas – que mostra um somatório dos principais mecanismos de apontamento de inadimplência empresarial, registros efetivados na base do SCPC, cheques devolvidos e títulos protestados em cartório – o fluxo manteve-se acima de 8% ao longo de praticamente dois anos. No entanto, registrou no segundo trimestre alta de 7,8% nos valores acumulados em quatro trimestres, valor 1,8 p.p. menor que o registrado no primeiro trimestre do ano, dando os primeiros sinais de arrefecimento.

Todavia, a partir do terceiro trimestre do ano diversas variáveis têm alterado positivamente suas trajetórias.

Em primeiro lugar, o mercado de trabalho está deixando de se deteriorar na velocidade em que se encontrava, com redução do ritmo de demissões e menor perda de rendimentos reais.

Um segundo ponto é que diversos setores da atividade econômica, tais como indústria, comércio e serviços, já mostram uma forte inflexão nas expectativas negativas e começam a traçar perspectivas um pouco mais animadoras para seus segmentos.

Ainda assim, vale a menção, estamos longe de avistarmos um céu de brigadeiro.

A recuperação desses setores produtivos ainda caminha, em geral, de forma muito lenta e essa demora no tempo de resposta dos agentes econômicos adiciona ruído ao cenário de crédito através de uma manutenção de spreads em níveis elevados. Portanto, talvez esta seja ainda a única tendência certeira para 2017 no cenário de crédito. Mesmo se vivenciarmos uma taxa Selic mais amena (em torno de 11% no fechamento do próximo ano), os juros finais para o consumidor e para as empresas manter-se-ão em patamares ainda considerados elevados.

O estoque de crédito, por sua vez, deverá retomar um crescimento positivo, ainda que pequeno. Com a retomada do crescimento da atividade econômica, o estímulo a um maior nível de consumo das famílias deverá puxar para cima a procura por crédito e consequentemente da oferta de recursos livres.

Ademais, o maior nível de atividade deverá contribuir para uma maior arrecadação de tributos, o que por sua vez tem relação direta com o nível de oferta de recursos direcionados. Ou seja, ambas categorias tendem a ofertar maiores níveis em 2017 do que neste ano, que deverá conferir uma elevação entre 2% e 3% do total do saldo de crédito.

Com relação à inadimplência, o cenário para consumidores deverá manter a tendência apresentada em 2016, estabilidade com boa possibilidade de queda, enquanto melhores notícias deverão vir das empresas.

Desde meados de 2014, o inadimplemento para a categoria empresarial não parou de crescer, fator que levou as instituições financeiras a fecharem a “torneira” do crédito mais cedo para os empresários do que a das linhas voltadas para as famílias. Como a diminuição do fluxo de atrasos do setor, poderemos observar uma pequena redução em seu atual nível, que deverá encerrar 2017 próximo de 5,0%, considerando os recursos livres.

A notícia vem em boa hora, pois deverá para interromper o elevado ritmo de falências, além de se alinhar com outras variáveis macroeconômicas, conjuntura que aponta para um desfecho relativamente positivo de nosso atual cenário econômico.

(*) Artigo originalmente publicado pelo site do IBEF (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo) em 17 de outubro de 2017.